mardi 22 juillet 2008

« Glam music » no Brasil

Rita Lee & Tutti Frutti, "Plateform boots & Glam rock" no Brasil em 1973
(foto site oficial Rita Lee)

Ao longo de quase vinte anos convivendo com a MPB, minha opiniões a respeito já estão um pouco « pervertidas », mesmo sendo eu ainda um jornalista estrangeiro analisando um tanto de fora a sua música. Mas acontece que estou cercado de amigos europeus que, como o ingênuo personagem da obra « Candide », de Voltaire, têm uma grande curiosidade - e boa vontade - de aprender sempre mais. Assim, gosto de « testar » sobre eles os efeitos de alguns discos e shows « brazucas ». E eles se submetem a isso sem preconceito, o que é um desafio em termos de música brasileira no exterior.
Um desses testes interessantes, a meu ver, foi assistir junto com « os ingênuos », ao show « Inclassificáveis », do Ney Matogrosso - o sétimo dvd ao vivo da sua carreira. Evidentemente, no início, esses meus amigos demonstraram uma reação um tanto destoante da usual para um show dentro de padrões mais convencionais, esboçando inevitáveis sorrisos intrigados, devido à teatralidade do cantor. Mas esse olhar meio divertido do espectador não demora a dar lugar à admiração. Na verdade, desconcertados, eles não sabiam exatamente o que pensar. Dessa forma, o Ney conseguiu atingir seu alvo, como ele sempre pretendeu. O seu poderoso canto nesse show metálico e mais rock, tanto quanto a iluminação, a « mise en scène » e o cenário, demostram que ali não há espaço para a improvisação. O Ney é senhor de cada elemento musical e cênico do espetáculo, como sempre, a tal ponto que este show altamente visual prescindia mesmo de uma gravação de seu álbum « Inclassificável » em estúdio, que nao me tinha seduzido. O repertório explicita todo o seu sentido assim, ao vivo. O show foi classificado por esses amigos meus como « majestoso », e deixou todo mundo sem fôlego – com razão. Eu, por minha vez, gostei, no making of, da idéia de se ter cedido a palavra aos ótimos compositores das novas canções desse repertório : Dan Nakagawa com « Um pouco de calor » ; Alzira Espíndola com « Existem coisas na vida » ; Pedro Luis - parceiro do álbum anterior « Vagabundo » - com « Fraterno » ; e o concretista Arnaldo Antunes, com a faixa título do show.
Ao revelar o Ney para os « Candides », dentre os quais muitos beberam na fonte da música inglesa, eles não puderam deixar de fazer uma comparação com o Glam ( ou Glitter ) rock dos anos 70 – 74. Visualmente, tanto o Brian Eno e suas plumas, quando integrante do Roxy Music, assim como o Peter Gabriel da época do Gênesis, não ficavam muito longe do estilo « camaleão » brasileiro dos Secos e Molhados, da mesma época. Não falo aqui de música, evidentemente.
Numa entrevista com o Ney, há uns anos atrás, tentando fazer algumas comparações com o David Bowie, o cantor se irritou comigo de repente, argumentando que ele era bem mais sexual do que o cantor britânico. De fato, o Bowie era mais ambíguo, enquanto o Ney afirmava fortemente sua sexualidade.
Por falar em Glam rock, reescutando a obra da Rita Lee, com o intuito de escrever o post em francês sobre a cantora ( vide 18 de junho ), pude constatar mais uma vez que a ruiva não somente era de vaguarda - com os Mutantes - na cena mundial, como também o eram seus dois primeiros discos solo, o « Build up », de 1970, e o « Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida », de 1972, além do «Atrás do porto tem uma cidade», que ela gravou em 1974 com a banda Tutti Frutti. Basta ouvir o cover fortemente decadente de « And I love her » dos Beatles, do «Build Up », para concluir que essa faixa caberia bem num outro famoso álbum de covers do mesmo gênero : o « Pin Up » do David Bowie... só que três anos antes ! Isso vale também para as canções « Menino bonito » e « Hoje é o primeiro dia… », através das quais Rita lança seus perfumes intoxicantes não tão distante do primeiro álbum do Roxy Music, já esse do mesmo ano. E basta dar uma olhada no encarte do disco « Atrás do porto… » para conferir o visual da Rita e da banda, de botas-plataforma, e ela mesma usando um corte de cabelo à inglesa, bem da época : franja curta e cabelos cumpridos lisos nas costas. Um look « à la » Aladdin Sane.

Marc Bolan (1947-1977): o Anjo caido do Glitter rock inglés

Enfim, para fechar com uma outra estrela do glam inglês, lembro aqui o nome do Marc Bolan, o então líder da banda T-Rex, como uma influência mais que óbvia em relação ao disco « Anormal » (2007), do Jonas Sá - irmão do Pedro Sá, guitarista da banda Cê do Caetano Veloso. A semelhança é evidente,tanto no uso dos metais e das guitarras, quanto na voz e « backing vocals » do cantor. Esses mesmos elementos do disco do Jonas Sá que evocam o « anjo caído » Marc Bolan, estão igualmente presentes no « The rise and fall of Ziggy Stardust and the Spiders from Mars » (1972), do próprio Bowie.
Afinal, parece que a MPB ainda tem aqui e ali um toque de « Glam ».


Secos e Molhados, 1973

12 commentaires:

Anonyme a dit…

Genial o vídeo com o Ney! Assisti a um show dele, num circo na Praça Onze, super "Glam", e as pessoas foram à loucura!!! Posso imaginar o espanto dos europeus. Inesquecível também o "Glitter" total dos Secos e Mohados em seu primeiro disco, o da capa com as cabeças servidas em pratos sobre a mesa... Bjs.

Anonyme a dit…

Olá, Daniel!
Semana passada o Nei deu uma canja no show do Rodrigo Santos aqui no Letras e Expressões de Ipanema...lamentavelmente eu perdi...em cima da hora tive que cancelar minha ida. Dizem que foi emocionante!
Por incrível que parela, hjj, antes de entrar aqui, mudei o post de meu blog e coloquei como tema, Ovelha Negra, da Rita...depois, se der vai lá conferir...
E por fim...sua entrevista com o Edu está praticamente confirmada...só precisamos saber a data certa que vc chegará para falar com a Dulce...e confirmar tudo...
Abraços,

Anonyme a dit…

OLá, Daniel! Você Me deixou "malade" de saudade do "Secos e Molhados". Eu achava o David Bowie liiiindo, mas o Ney sempre foi muito mais "macho" mesmo! Adorei esse post, me levou a uma viagem no tempo...

Márcio a dit…

Daniel, um elemento marcante na conexão glitter/glam com a mpb foi o grupo Dzi Croquettes. Formado em 1972 por dançarinos e atores de teatro, não deixou registro em disco (pelo menos que eu saiba), mas alcançou grande sucesso com seus musicais em teatros do Brasil (do Rio de Janeiro, mais precisamente) e da Europa. No youtube é possível encontrar algum material sobre eles. Saudações!

Anonyme a dit…

Márcio, é verdade. Os Dzi Croquettes, do pouco que eu me lembro, foram uma espécie de precursorres mesmo desse glam; mas acho que nunca gravaram nada. E do que ouço contarem me parece uma coisa mais parecida com um teatro de revista mais ousado, gay, e na época ainda meio confinado ao público da antiga Galeria Alaska, em Copacabana. Posso estar errada -eu mesma nunca fui a show deles - só me lembro de algumas fotos.

Daniel Achedjian a dit…

Salve Pandora! Pois é! Essa capa dos Secos e molhados poderia pertencer ao mundo do cantor e "performer" Alice Cooper. Outro îcone do Glam teatral. So que esse ultimo era americano, se nao me engano...abraços

Daniel Achedjian a dit…

Bom dia Cal, O Ney na "Letras e expressoes"? So acontece no Brasil!! Pena que perdeu.
Vou sempre ver seu site, cara, so que nao deixo comentarios!!
E por fim, genial a noticia sobre o Edu! Chego dia 15 no Rio, mas minha agenda se encheu bastante e so vou poder o encontrar a partir do dia 26 de agosto. Vamos nos falar nos mails privados...abraços

Daniel Achedjian a dit…

Olga, Marcio, sabia da existencia da Galeria Alaska e tinha lido algumas coisas em relaçao ao grupo Dzi Croquettes. Mas nao me lembro o que, nem em que livro. Pode ser que seja no "Noites Tropicais" do Nelson Motta, mas estou em Paris agora e nao posso conferir... Vou ver no Youtube para conhecer esse fenômeno...Obrigado pelas informaçoes, abraços...

Anonyme a dit…

Daniel, Márcio,
Lembrei do nome do cara que criou os "Dzi Croquettes":
Lennie Dale. Corógrafo, bailarino, etc. Tem fotos dele que são a cara do Ney Matogrosso "transformado". O visual é o mesmo; e o grupo, só de homens ( gays ou não ) são pré-bossa nova, e se apresentavam tb. no Beco da Garrafas. O Ney deve ter se inspirado bastante nele. Bjs.

Márcio a dit…

Daniel, além do pioneirismo, o que surpreende bastante na carreira dos Dzi Croquettes foi o sucesso que obtiveram fora do Brasil, com longas temporadas (em 1973 e 1974) no Le Palace, em Paris. Geralmente artistas brasileiros, mesmo os de sucesso no exterior, fazem tournées com uma ou duas apresentações em cada cidade. Olga, Lennie Dale foi mesmo de grande importância para a mpb, e não só para o grupo Dzi Croquettes, pois trouxe padrões de ensaio e profissionalismo que não eram comuns no Brasil dos anos 60.

Anonyme a dit…

Márcio, você tem razão. A partir do teu comentário e da lembrança do nome do Dale, dei uma olhada no Google e fiquei pasma: ele foi orientador de palco da Elis Regina! Valeu! Abraço.

Daniel Achedjian a dit…

Agora sei! A importancia do Lennie Dale foi comentado no famoso "Chega de saudade do Ruy Castro. Até existe um cartaz feito pelo César G Villela, "designer" das grandes capas de discos da Bossa (selo "elenco" de Aloisio de Oliveira.) Mas nao sabia da conexao com Dzi Croquettes.abs...

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